Em abril de 2009, um conhecido jornalista brasileiro, homem das letras, da tevê e da música, escreveu que taquigrafia é sinônimo de atraso. Virulento, propôs aposentadoria para todas as taquígrafas do Senado Nacional brasileiro e extinção dos seus cargos públicos. Uma injustiça causada pelo desconhecimento do assunto. Taquígrafos existem porque não há substitutos para eles. No caso de taquígrafos legislativos, o alvo do articulista, eles são peças-chave tanto para a divulgação dos trabalhos legislativos, dentro da política democrática de transparência da coisa pública, como para assegurar a fidedignidade do relato escrito das ações parlamentares que passarão à história de cada casa legislativa. Porém, taquigrafia é muito mais.
Para aclarar um pouco o tema e fazer justiça a esta atividade tão antiga quanto a escrita, eis uma contribuição sincera.
O que fazem os taquígrafos
O taquígrafo registra a fala humana de maneira rápida e eficiente, em tempo real. Primeiramente realiza o apanhamento taquigráfico, que emprega sinais gráficos diversos, como símbolos e/ou abreviações que variam de acordo com o sistema empregado (Gregg, Leite Alves, Maron etc.). Em seguida, faz a transcrição desses códigos para a forma escrita convencional ou lê o texto anotado em outro idioma diferente daquele em que o discurso foi proferido. Pode também solicitar, catalogar, arquivar e reproduzir documentos originais e registros sonoros e visuais, quando necessário.
Entre outras entidades, autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista, fundações, federações e confederações recorrem – e muito – aos serviços de taquigrafia. Nos produtos de grandes marcas estão embutidos serviços de taquigrafia, pois as empresas que fazem pesquisas de mercado contratam taquígrafos para anotarem bate-papos e brainstormings que organizam com consumidores, à cata de opiniões sobre produtos e serviços, necessidades e desejos de consumo.
Os serviços de taquigrafia das casas legislativas registram, imediatamente após, tudo que é dito – relatado, debatido e votado – em sessões ordinárias, extraordinárias, solenidades, reuniões de comissões permanentes, extraordinárias ou parlamentares de inquérito, audiências públicas, conferências, posses e outras atividades parlamentares. Normalmente, tudo que é realizado em plenário ou auditório nesses estabelecimentos deve ser publicado no seu diário oficial. Muitas vezes, são registrados também seminários, mesas-redondas, discussões, votações, campanhas, entrevistas, homenagens, debates e reuniões realizados em outros ambientes na mesma casa ou fora dela, como sindicatos, comunidades, escolas, outros órgãos públicos. Também é intensa a produção taquigráfica dos órgãos do poder judiciário.
Taquígrafos concursados têm fé pública. Ou seja, mesmo que todos os registros eletrônicos ou antiquadamente magnéticos sejam destruídos ou alterados, as notas taquigráficas valerão como prova em qualquer necessidade. Por isso é interessante e mais seguro que os serviços de taquigrafia não sejam terceirizados. Mais do que tudo, o taquígrafo é um ser extremamente sério, dedicado e discreto com relação ao seu trabalho, em qualquer esfera de atuação.
Tentar registrar a fala humana em tempo real e ser fiel ao que foi dito é atividade que existe há milênios. Junto com os desenhos, gráficos e abreviaturas, a taquigrafia sempre foi forma de concisão e rapidez no armazenamento e divulgação de informações. No filme Alexandre, há um elegante escriba e seus assistentes. De que forma os escribas tomavam nota dos devaneios de seus senhores? Ora, somente e unicamente por meio da taquigrafia.
Contornando o ambiente e a anti-oratória
Taquígrafos trabalham sob quaisquer circunstâncias, como durante uma falha do sistema elétrico, falhas de gravação, ausência de pilhas para pequenos gravadores ou descarregamento de bateria para os modernos mínimos gravadores digitais. E o fazem não apenas sob excelentes condições de trabalho, sonoridade e visibilidade, mas também em locais onde a acústica é falha ou quando há tanto ruído ambiente que o registro sonoro fica seriamente comprometido, assim como em locais tumultuados e apinhados de gente, desde reuniões feitas em grandes mesas, nas quais, muitas vezes, as xícaras de café, assessores e técnicos competem com a voz dos oradores, a locais onde o conforto social é utopia.
Muito raramente discursos e falas são perfeitos. Exemplos são as pessoas que derrapam na construção básica da língua pátria por pura ignorância, falta de escolaridade, dificuldade no aprendizado, desinteresse em se aperfeiçoar. Palestrantes podem ser estrangeiros sem domínio perfeito do idioma em que discursam. Podem ser indivíduos com sérios problemas respiratórios ou de fonação, como portadores de síndromes genéticas, sequelas de acidentes cerebrais, mecânicos ou vasculares, doenças cerebrodegenerativas, deformações no aparelho fonador, entre tantos exemplos que podem levar um indivíduo a ter dislalias.
Algumas pessoas sem problemas físicos podem ter dicção deficiente, como falar de modo fanho ou gago, para dentro, com chiados, ralentando, ou simplesmente podem estar em uso de aparelhos ortodônticos ou terem recém-recebido alguma dose de anestésico para tratamento dentário. Ou ainda apresentar problemas emocionais diversos, que as levem a dislogias mais ou menos acentuadas, como pensamento não-linear, raciocínio de trás para frente, logorreias. Existem os que falam quase por dialeto (oriundo de regionalismos, modismos ou necessidade de chamar a atenção para si ou para um grupo ou causa social) ou que pronunciam as palavras tão rapidamente que parecem falar outro idioma. Encontram-se os de fala monocórdica na qual praticamente não há indicação de pausa, da mais simples vírgula à paragrafação, os que só falam sussurrando e os que só se manifestam aos gritos.
Muitos outros "estilos” de anti-oratória podem ser lembrados. Por exemplo, uma fala pode ficar confusa quando uma pessoa usa de todos os artifícios para desvalorizar, desmoralizar, intimidar, delatar, acusar alguém. Um indivíduo pode reconduzir seu próprio raciocínio dependendo da reação do desafeto, da vítima e/ou dos presentes. Ao contrário, pode procurar álibis para si, defender-se. Ao sabor das emoções ou do puro sentimento de vingança ou autopiedade, pode proferir um discurso cheio de lapsos, incoerências, inversões de raciocínio, pausas, orações sem os elementos fundamentais, inconsistências gramaticais.
Uma pessoa pode procurar palavras, tentando articular um pensamento no momento da fala, e assim se perder na construção do discurso. Discussões acaloradas ou grandes emoções podem resultar até em lapsos de memória e desmaios. Nessas situações, muitas palavras são mal proferidas, ficam ininteligíveis ou inaudíveis ou são extremamente inadequadas.
Em outro extremo, há os que falam de forma extremamente erudita, com discursos recheados de palavras em desuso, termos em idiomas mortos ou estranhos ao taquígrafo; podem citar trechos inteiros de poemas de construção complexa ou trechos de autores em outros idiomas, referir-se a muitas siglas ou jargão técnico-científico extremamente hermético. Embora a erudição seja algo bem-vindo, taquigrafar essas falas pode ser tarefa muito complexa, em especial quando o orador não fornece uma cópia do discurso, para conferência. Na prática, apesar da erudição, acaba sendo outro exemplo de anti-oratória.
A imaginação não é o limite para tantas histórias que os taquígrafos têm para contar.
Humanos e gravadores
Taquigrafia e gravação são dois instrumentos inseparáveis hoje. Essa parceria pode ser a única maneira de resgate de um momento etéreo, como outro qualquer, que não poderia deixar de ser fisgado.
Antes da proliferação de aparelhos de gravação de sons, os serviços de taquigrafia que desejavam transcrições fidedignas contavam com três ou mais taquígrafos anotando um mesmo período de evento simultaneamente. Dependendo dos oradores e das condições de trabalho, deslocavam-se mais taquígrafos para a tarefa. Afinal, é impossível, por exemplo, uma única pessoa anotar falas simultâneas e registrar movimentos paralelos, como troca de presidência, manifestações de platéias, apartes inesperados. Sem gravador, a quantidade de profissionais taquígrafos no Congresso Nacional, por exemplo, seria inviável.
Atualmente, ao menos dois taquígrafos costumam trabalhar juntos, alternando-se em pequenos intervalos de tempo combinados entre si. No registro de um congresso ou seminário, uma equipe de taquígrafos é contratada, ficando dois taquígrafos responsáveis por cada uma de suas palestras, mesas-redondas etc., por determinados períodos de tempo, sendo as duplas substituídas por outras após determinado número de horas. É muito produtivo quando são acompanhadas por algum supervisor ou pessoa de apoio logístico. Terminado o evento, as duplas o transformam em um texto único.
Em casas legislativas, um time de taquígrafos se alterna em pequenos espaços de tempo, de forma a agilizar a transcrição do material que terá que ser publicado o mais rápido possível. Em geral, um taquígrafo faz anotações (apanhamentos) a cada cinco, 10 minutos, raramente 15. Cinco minutos de pronunciamentos estão registrados, em palavras, em computador, em média uma hora após o seu apanhamento. Isso garante que, no caso de um discurso de 5 minutos, em um esquema de tabelas de apanhamentos de 5 minutos para cada taquígrafo, cerca de uma hora depois o orador tenha, em mãos ou via internet ou intranet, a reprodução fiel do que proferiu; para 20 minutos de fala, em pouco mais que isso, cerca de 1 hora e 20 minutos, porque cada taquígrafo que fez apontamento inicia sua tarefa cinco minutos após o outro. Um pronunciamento de 20 minutos é totalmente reproduzido, portanto, cerca de 1 hora e 20 minutos depois, em média.
Na busca de excelência, o taquígrafo pode solicitar a um palestrante que esclareça uma fala ou palavra que ficou incompreensível ou para precisar a grafia de siglas, nomes estrangeiros ou próprios. Muitas vezes, o orador fica profundamente agradecido ao taquígrafo por isso. Em geral, taquígrafos são vistos como profissionais competentes, sérios e éticos. Apesar disso, muitos dos quadros de taquígrafos nas casas legislativas brasileiras são insuficientes, em números, para suas necessidades.
Revisões. Ética
O fiel e legítimo registro taquigráfico deve tentar reproduzir o que foi dito, não reescrevê-lo. Mesmo sendo quase impossível a qualquer registro escrito reproduzir a fala humana de forma absolutamente fiel ao que foi proferido pelo orador, resta ao taquígrafo usar com domínio e bom-senso os sinais de pontuação – e esse é o grande pulo do gato da taquigrafia.
Mesmo a melhor pontuação nunca dá o verdadeiro tom da inflexão da voz humana, que revela – ou tenta ocultar – suas emoções e intenções. Em teatro, podem-se dar muitas entonações e significados a uma pequena frase, sem lhe alterar a pontuação. A diferença entre oração subordinada adjetiva explicativa ou restritiva é exemplificação clássica. Se o orador dá a pausa correta, não deixa dúvida quanto à pontuação. Porém, é comum ouvir-se, de forma indistinta e sem pausa, "O Pedro que saiu mais cedo já chegou” (há mais de um Pedro, e apenas um deles saiu mais cedo e já chegou), mesmo que o intento do raciocínio tenha sido "O Pedro, que saiu mais cedo, já chegou” (há apenas um Pedro, e ele saiu mais cedo e já chegou). Transporte-se isso para uma reunião de diretoria, um conselho técnico-científico ou uma cúpula governamental e veja-se o transtorno que pode ocorrer com a simples omissão ou o acréscimo indevido de vírgula(s).
Havendo um revisor-taquígrafo, ele pode, de forma elegante e discreta, não comprometendo a veracidade do registro taquigráfico, ouvindo a gravação e analisando toda a fala transcrita do orador ao longo de um evento, dar algum nexo a certos trechos do discurso sem sentido ou confusos, com pensamentos inconclusos ou sussurrados, palavras trocadas, erros em citações de nomes ou documentos. Não há revisores-taquígrafos em todas as casas legislativas, contudo.
Nas pesquisas de mercado ou nos escritórios onde trabalham secretárias-taquígrafas, não existe a figura do revisor de textos. Já nas grandes empresas, confederações e instituições públicas, há os revisores não-taquígrafos, que adaptam os textos a uma linguagem menos coloquial, menos repetitiva ou redundante, mais enxuta ou simplesmente mais de acordo com a orientação que recebem das instâncias superiores ou segundo o desejo do próprio palestrante. Muitas vezes, trechos inteiros são suprimidos ou substituídos por outros, casos em que, desejando-se lisura documental, acrescenta-se à publicação final a indicação "Revisado pelo autor”. Muitas vezes, contudo, o texto preparado pelo taquígrafo serve de base para a preparação de súmulas ou comunicados, nunca sendo publicado na íntegra. Nem todos os parlamentos do mundo publicam de forma integral o que é falado em seus plenários.
Para o taquígrafo, a postura ética é fundamental. Mesmo que tentado a dar discreta ênfase ou redução de impacto a determinada fala, o que é plenamente possível com sutis até significativas modificações no texto, cabe a esse profissional manter-se fiel ao que é pronunciado pelo orador. Suas simpatias, empatias e antipatias, ideologias, crenças e interesses pessoais não devem interferir com o fiel propósito da taquigrafia. A consciência de sua importância histórica e social deve fazer parte de sua formação profissional e, antes de tudo, de seu íntimo.
Pressa, precisão e estresse
Em geral, os relatórios e atas precisam ser lidos e publicados em tempo curto. Depoimentos, entrevistas, debates, pronunciamentos precisam estar disponíveis o mais rapidamente possível. Os diários oficiais das casas legislativas são distribuídos na manhã seguinte ao dia em que o evento registrado ocorre, mesmo que uma sessão parlamentar termine pela madrugada. Em grandes empresas ou grandes eventos, também costuma ser urgente a análise do material pelas autoridades interessadas ou sua divulgação, sendo exigidas transcrições rápidas e serviço perfeito. Atualmente, com o advento da internet, tudo isso se acelerou. Muitos querem colocar on line seus discursos, o mais rapidamente possível, mesmo atropelando os diários oficiais ou relatórios. Segue o texto cru do taquígrafo, que expõe na rede seu talento junto ao do orador.
Quanto maior a experiência acumulada do taquígrafo com o(s) palestrante(s), melhor é a compreensão da sua fala, como, por exemplo, em casas legislativas, onde muitos parlamentares são reeleitos por legislaturas consecutivas, ou em diretorias ou presidências de empresas que não alteram muito seus quadros ao longo do tempo. O taquígrafo capta gesto, olhar, inflexão, intenção. Também não pode titubear um único segundo, perder a elegância e a discrição e ou deixar de atentar a um gesto significativo enquanto anota tudo que é dito pelos oradores, durante horas de trabalho. Isso pode deixar sua cabeça zonza, o pensamento fraco, as pernas descompassadas, os ombros pesados e doídos, a visão cansada, os ouvidos meio surdos, as mãos e costas contraídas, as emoções mexidas.
E há tensões especiais, como taquigrafar reuniões altamente confidenciais que deliberadamente não são gravadas, ou ler, em voz alta, o que acabou de anotar em sinais taquigráficos, em meio a autoridades ou grandes platéias. Há ocasiões em que taquígrafos podem ser expostos a situações de risco, como no caso de briga de oradores ou invasão de dependências por manifestantes raivosos ou forças de segurança.
Por tudo isso, é recomendável que taquígrafos tenham regimes especiais de horário e carga de trabalho.
Taquígrafos agem em uníssono, verdadeiro moto contínuo, num grau de concentração e superação invejáveis para qualquer empresário ou administrador público. O profundo senso de dedicação e presteza desses profissionais, sua capacidade de trabalhar – e superar problemas – em equipe e individualmente lhes garantem eficiência, economia de recursos e elogios.
Design simples
Apesar de a indústria da informática e as pesquisas de inteligência artificial procurarem, não existe ainda um software milagroso que transcreva de modo brilhante a fala humana, menos ainda em tempo real. Apenas textos mais simples, proferidos por pessoas de vocalização perfeita, com a fala bastante pausada e pontuação ditada, não têm palavras trocadas por homófonas ou cacofonias. Mas oradores não costumam ser dubladores ou cantores nem ditam sinais de pontuação enquanto discursam. O que é produzido costuma ser uma coletânea de pérolas non sense. Para se produzirem textos melhores, é necessário que alguém repita para o computador o que foi dito pelo palestrante e que o texto receba a revisão de alguém que esteve presente ao evento e que, portanto, fez anotações resumidas e rápidas... como as taquigráficas.
A modernização digital da taquigrafia poderá ser feita com a adoção das telas sensíveis ao toque e programas que leiam e interpretem os símbolos taquigráficos ou com sistemas de digitação substitutiva. Cada taquígrafo, ao longo da vida, desenvolve seu próprio método de escrita condensada, como cada ser humano traça um caminho para cada pensamento em seu cérebro, essencialmente igual mas profundamente individual. Dessa forma, não apenas teria que ser criado um programa para cada taquígrafo, como ele teria que receber várias atualizações substanciais. Provavelmente seria mais difícil prever a evolução de cada modo taquigráfico individual, para a construção desses recursos, que prever a evolução de vírus, para a produção de vacinas. No final das contas, cada taquígrafo ele mesmo precisaria desenvolver seu próprio programa. Esperam-se novas tecnologias, e elas serão bem-vindas, se fizerem a taquigrafia evoluir, pois a inteligência humana tem avidez por novidades.
A taquigrafia tem a capacidade de se reinventar e se multiplicar, como um DNA mutante. Como os seres vivos mais antigos na face do planeta, subsiste exatamente porque tem conceito e design simples: um instrumento que escreva sobre um suporte e um taquígrafo.
Taquigrafia jovem
Por mais que este pequeno ensaio seja abrangente, ela ainda não fala tudo sobre a taquigrafia e nem de longe faz jus à sua importância em todo o mundo ainda hoje.
Assisti, há alguns anos, a um filme que mostra Kofi Annan discursando, ladeado por uma taquígrafa, que, em pé, com uma bolsa caindo dos ombros, um bloco e um lápis na mão, em grandes gestos anotava tudo que o grande nome da ONU dizia. Mal ele terminou toda sua fala, ela leu, em alemão, o que ele acabara de pronunciar em inglês. Foi uma opção pela taquigrafa bilíngue ao serviço de intérprete, cujo motivo pode ter sido o orador não ser interrompindo enquanto discursava. Ao final, esse filme transformou-se numa espécie de homenagem a todos os taquígrafos do mundo.
Jovens que tomam contato com a taquigrafia têm procurado cada vez mais esse método de escrita, que tem tudo a ver com os novos tempos de internet. Inclusive, há um método, fonético, que se baseia na redução de palavras e que é similar à linguagem jovem dos e-mails, torpedos e redes sociais virtuais em geral: no sistema Sound Script, cortam-se vogais, letras substituem prefixos e sufixos, usam-se muitas abreviaturas, alguns outros sinais óbvios. Quando criado, foi considerado apenas uma técnica para secretárias, mas, ao longo dos anos, impôs-se como um método que aprova muitos candidatos em concursos públicos de taquigrafia – e eles continuam trabalhando com ele ao longo dos anos. Em tempos de rapidez e textos sucintos, sem saber a juventude acabou chegando ao conceito de taquigrafia embutido nesse método, dando a ela novos ares e símbolos, a face do mundo globalizado em velocidade de banda larga, Web.3 e o que mais vier.
Com a experiência e a técnica de milênios de taquigrafia, anotar aulas, exercitar matérias escolares em casa, por exemplo, poderia ser algo mais afinado com a velocidade da inteligência dos jovens de hoje. A diferença é que o registro taquigráfico não comete as gafes gramaticais do internetês. Portanto, se as escolas adotassem o ensino de taquigrafia, a inteligência e outras aptidões dos alunos seriam ainda mais estimuladas, e a gramática deixaria de ser assassinada.
Vale a pena pesquisar a diferença entre taquigrafia, estenotipia, estenografia e mecanografia. Pode-se procurar na internet a diversidade de métodos de taquigrafia consagrados e as novas propostas para a atividade, como também aparelhos e software específicos. A cada ano, surgem mais sites, blogs e revistas on line dedicados à taquigrafia, com grande afluência de internautas, e acontece um interessante intercâmbio de taquígrafos espalhados por todo o mundo, com a organização de congressos, competições de velocidade, troca de informações, comunidades virtuais e grupos de estudo. Na internet, são oferecidas aulas de taquigrafia e ditados para treino de velocidade de escrita taquigráfica, links para instituições e grupos especializados, além de uma gama muito agradável de excelentes textos que esclarecem o que é taquigrafia e resgatam a história dessa atividade tão especial.
Mas não só de atividades virtuais vive o mundo taquigráfico. Existem cursos presenciais de taquigrafia para todos os métodos, pois uma preparação sólida é fundamental em especial – mas não somente – para as pessoas interessadas em participar de concursos públicos. Afinal, a formação de um taquígrafo profissional requer tempo e dedicação.
Evolução constante
Além da experiência profissional, um bom taquígrafo necessita ter adequado nível cultural, estar atualizado com as mudanças da língua e as notícias mais importantes que são divulgadas em diversos meios de informação. Precisa ler em outros idiomas, conhecer lugares, visitar museus, ler bons livros e revistas, fazer cursos, participar de debates, seminários e mesas-redondas sobre diversos assuntos, ser íntimo e estar a par de novas tecnologias. E precisa trocar idéias com seus pares, pois taquígrafos são profissionais como outros quaisquer, com suas necessidades trabalhistas e profissionais.
Isso remete a dois outros fatores importantes. O primeiro deles é a diversidade de formação acadêmica dos taquígrafos. Não basta saber escrever bem para ser bom taquígrafo. É necessário o domínio de vários assuntos e o acesso à informação, quer seja por intermédio de boas gramáticas, dicionários, enciclopédias, material técnico-científico, literatura leiga, jornais e revistas, impressos ou em meio eletrônico. A política de contratação de pessoas formadas em qualquer curso superior é mais do que bem-vinda aos ambientes taquigráficos, pois a troca de informações e orientações entre suas equipes dão um upgrade considerável ao trabalho. E isso em tempo recorde. Todos do grupo aprendem, todos se enriquecem. Os ambientes de trabalho dos taquígrafos são verdadeiros workshops diários e sem limites temáticos.
O segundo fator na qualidade dos profissionais taquígrafos é sua valorização e seu reconhecimento. Para que isso ocorra, é necessário que seu trabalho seja discutido e divulgado, além de respeitado no mercado de trabalho. Associações de classe, nacionais e internacionais, congregam taquígrafos por todo o mundo, na busca de sua valoração, aperfeiçoamento e interesses comuns.
Considerar o serviço taquigráfico dispensável é um erro. Podem-se contratar estagiários ou firmas terceirizadas ou abrir concursos para profissionais de segundo grau, para transcrever discursos gravados – e reduzir custos. O difícil é explicar, por exemplo, a acionistas de empresas, resultados não condizentes com atas e comunicados; ou, a juízes, jornalistas e à população em geral, por que as tevês mostraram uma coisa e o texto nos diários oficiais é outro. Ou dar satisfação aos pesquisadores e às gerações futuras por que não houve registro histórico fiel de fatos relevantes para a humanidade.
Hoje – e principalmente – os diários e outros documentos de informação oficiais servem de termômetro e orientador para que a população acompanhe as atividades dos parlamentares, cobre suas ações – acertos, falhas e omissões – e tenha parâmetros para reconduzi-los ou não aos cargos ou a outros postos em eleições futuras.
Taquigrafia é uma atividade que existe em todos os países, do menor e mais perdido no interior da África aos desenvolvidos e aos grandes órgãos decisórios do mundo. E não se restringe a profissionais taquígrafos, pois qualquer pessoa pode aprender a taquigrafar e usar essa habilidade para facilitar seu dia-a-dia, como jornalistas, professores, assessores e quaisquer pessoas que precisem escrever rapidamente – e/ou de forma discreta. Afinal, taquígrafos não são apenas senhorinhas em vias de aposentadoria.
A taquigrafia indica ter um longo caminho junto à humanidade. Sua praticidade pode estender-se à vida de muitas pessoas de variada formação profissional, faixa etária, idioma, região do mundo. O uso intensivo do cérebro que ela estimula também pode ser coadjuvante para o desenvolvimento psicofísico de jovens a idosos, de pessoas doentes a portadores de cérebros bem-dotados. Sua complexidade e racionalidade têm sido responsáveis pelo uso de recursos taquigráficos em sistemas de criptografia, tão importantes em proteção de redes e contas individuais.
Por fim, só resta dizer o quanto é fascinante assistir a um taquígrafo executar essa verdadeira arte da inteligência humana. Cada método é um fascínio, com seus riscos, círculos, símbolos, letras, códigos diversos e bonitos, a mão hábil fazendo um pequeno balé sob nossos olhos. É como se cada taquígrafo guardasse em si os segredos e poderes dos indivíduos que inventaram a escrita e dos posteriores escribas, os míticos senhores do conhecimento por muitos séculos da nossa história. A cada novo taquígrafo que surge, parte da esperança da perpetuação da cultura humana se renova. Com a informática e as telecomunicações, em especial a internet, passado e presente se reencontram em formatação de futuro. Jovens buscam, espontaneamente, uma técnica que muitas de suas avós aprenderam airosamente há décadas. E, como afirma Marina Hernandes, a taquigrafia e seu trabalho de indexação de textos, sons e imagens – atividade já desenvolvida na Câmara dos Deputados brasileira – "são uma premissa para a websemântica, que terá mecanismos de busca ainda mais complexos”.
Mais do que uma técnica milenar, a taquigrafia é uma arte que agrega o passado e o presente da cultura humana e que certamente fará parte do seu futuro.
1 A autora, Nathercia Martinelle, desde fevereiro de 2007, é cronista e repórter do Tem Notícia – o jornal do pensamento brasileiro, com dezenas de crônicas, ensaios e entrevistas publicados nesse veículo. Foi professora-convidada de múltiplas áreas, em diversas instituições, trabalhou em editoras prestigiadas e foi assessora de governos como produtora de material didático e eventos técnico-científicos, tendo integrado campanhas de saúde pública de combate a doenças crônico-degenerativas em todo o território nacional. No Rio de Janeiro, assessorou governos também na área de assistência social e na implantação de projetos culturais. Atuou como cantora, dubladora e ilustradora científica, assim como foi letrista, cartazista e designer gráfica. Tem escritos um manual de redação e, ainda não publicados, um livro de contos, outro de ensaios e um romance.
2 Texto publicado originalmente no jornal on line Tem Notícia, em 22 de maio de 2009, e depois distribuído no IV Congresso Eleitoral, X Encontro Nacional da Unataq-Brasil e II Fórum Taquigrafia Parlamentar e Judiciária. Sua tradução para o inglês foi financiada pela Taquibrás, em cujo site (http://www.taquibras.com.br) encontram-se ambas as versões.
Alguns links relativos ao ensaio
http://www.taquibras.com.br (TAQUIBRÁS, instituição brasiliense dirigida pelo renomado professor PAULO XAVIER, profissional de taquigrafia há 56 anos, ex-diretor do Departamento de Taquigrafia, Revisão e Redação da Câmara dos Deputados)
http://www.taquigrafiaemfoco.com.br (o vídeo com a taquígrafa bilíngue e Kofi Annan pode ser visto no site Taquigrafia em Foco, que tem direção do professor WALDIR CURY, autor de diversos livros de taquigrafia, taquígrafo aposentado da Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro e notório taquígrafo)
http://www.adelinataquigrafia.com (site do Sistema Sound Script, criado e desenvolvido por MARIA ADELINA AZEVEDO há 20 anos, no Rio de Janeiro)
http://www.taquigrafica.com/ (site da Revista Taquigráfica, criada por DIOGO DE ALCÂNTARA PEREIRA, da geração Orkut)